segunda-feira, 30 de junho de 2008

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Sentada de lado, cabelos ao vento.
Mil besteiras passando em seus lábios, coisas banais, coisas emaranhadas, saídas e logo esquecidas.
Nem sabia o que dizia, pois sua mente estava longe.
Pensava na felicidade.
Devaneava em mil planos, mil realizações, mil sonhos, que se materializavam na figura que lhe fitava. Pensava como ia ser feliz se tivesse aquele homem.
Sentado de lado, vento na cara, era mais que uma fantasia.
Ali do seu lado era realidade.
Como sua família ficaria feliz com uma união como essa?!
Um homem direito, sério, bom emprego. Que não daria por ele? Que não daria para ele?
E por isso aquela era a hora mais alegre do seu dia. A hora em que sentava de lado, hora em que maioria das pessoas não presta atenção, nem vê passar, era a hora mais esperada.
Sentia o calafrio na barriga só de ver o ônibus vindo, e quando subia, quando sentava, quando olhava...
Aquele homem do seu lado estava lá pra ser seu homem.
E sabia que seu jeito recatado, seu sorriso tímido, sua intenção pura, haveriam de encantá-lo, de fisgá-lo, de prendê-lo ao seu lado.
Mesmo consciente de que a metade de hora que passavam juntos todo dia era pouco, muito pouco, sentia algo dentro dela que dizia sim.
Um homem simpático, o cobrador, a esperança que alimentava tão ardentemente.
Tantas pessoas que passam por ele sem olhar, sem perceber, sem dar bom dia, mas pra ela tinha virado algo tão especial.

Só não esperava por aquele dia. Um dia normal, a conversa normal, os dois normais. Até que subiu no ônibus uma moça.
Uma moça! Outra moça.
Trocaram sorrisos e se reconheceram. Trocaram palavras e agradaram-se.
Uma outra moça?
Sem saber como aconteceu, ela estava em seu lugar. Era ela de lado, e os cabelos dela ao vento. Não era tão mais bonita. Mais arrumada, sem dúvidas. Salto alto, maquiagem. Cabelo esticado, roupa bem vestida de marca barata. Era toda contraste para a menina de longos cabelos crespos presos num rabo de cavalo. Era toda ressaida, toda brilho, toda luz.
O lugar era imediatamente dela por direito.
De lado, naquele lado.
Aos poucos foi-se percebendo algo mais. Os passageiros também a notavam. Era uma linda morena. Seu sorriso era demais gracioso. Seu riso era demais iluminado. Não que fosse tão mais bonita que a outra, mas era sem dúvida melhor.
Enfurecida, sem perceber, foi sentar-se na frente, emburrada, ouvindo cá e lá uma risadinha mais alta vinda do fundo do veículo. Agüentou como pode a humilhação que achava que sofria. Mas a verdade é que ninguém a viu ser substituída, isso porque ninguém a viu absolutamente. Mergulhada em ódio e indignação, teve de voltar trotando até a catraca e buscar seu troco. Maldito, porque não havia dado antes? Aquela desculpa antes tão bem vinda e provocante foi agora um martírio.
Olhou com raiva para os dois, que sequer notaram sua presença. E neste momento notou uma figura sentada só num assento.
Um pouco mais velha, branca, alta, era realmente imponente. Observava seu rosto encoleirizado com olhos escuros e inteligentes. Seus cabelos logos voavam com o vento, mas ela estava de frente. Não que fosse tão mais bonita que ela, mas era muito diferente de uma forma bela. Pensou que se fosse como ela seus sonhos seriam maiores. Pensou que se fosse assim diferente mereceria algo melhor que um cobrador. Pensou que se fosse outra, lhe viria algo de melhor. E mesmo que se decepcionasse, seria por alguém que valesse a pena. Virou-se e desceu do ônibus melancólica.
Sem dúvida naquela noite choraria copiosamente até dormir.

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