sábado, 30 de novembro de 2013

Quem diria

Primeiro ergueria as paredes, querendo afastar os perigos. Ia querer cercar.
Depois construiria um telhado, querendo inibir o sol e o calor, a chuva e o frio. Ia querer cobrir.
Colocaria uma porta e trancaria. Ia querer me proteger e ser só contra o mundo.
E eu seria só enquanto viveria nesta casa que seria minha casa, com as coisas que seriam minhas coisas, e sentimentos que seriam só meus.
Ia querer me isolar atrás desses muros, andar pelos quartos e salas vazios, afastando todo o resto.
Me trancaria em minha casa mesmo sabendo que era a ti que eu mantinha do lado de fora.

E assim eu estaria a salvo.

Mas eu então, quem diria, sentiria falta do mundo. De viver como o mundo, e sentir como o mundo.
Sentiria saudade do sol e do calor, da chuva e do frio. E me veria desejando até o perigo.
Assumiria o risco.
E num ato de loucura, sim, loucura, viraria a chave, giraria a maçaneta, abriria a porta.
Como um milagre, ainda estarias lá.
E só então, quando entrasses enfim, minha casa deixaria de ser uma casa.
Se tornaria um lar.

sábado, 23 de novembro de 2013

Se pensa que vai explodir
de carregar o peso de um mundo sozinha
um mundo inteiro, denso, nebuloso, insone, solitário
Se explodir
virando milhares de outros mundos
todos desabitados, desolados
Se engana.
Ao contrário, definha. 

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Sonhei um sonho.
Que virou pesadelo.
Que virou outra coisa...
era eu acordando.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Não é nada disso:

A carne que rasga, a pele que esfola, o sangue que escorre
Acalmai-vos
não é morte.
A dor que sufoca, o grito que enrouquece, o silêncio que amarga
Suportai
não é morte.
A angústia que desentranha, o choro que regurgita, o desespero que paralisa
Tranquilizai-vos
não é morte.
A saudade que mata, a vontade que mata, o arrependimento que mata
Diverti-vos
também não é morte.

(é só ciume)

sábado, 16 de novembro de 2013

Aquela voz que cala quando há palavras a serem ditas
Aquele tom que desafina quando a música é pra ser ouvida
O grito que soa quando é carinho que se espera
O olhar que destoa quando é entendimento que se busca
Quem sou eu pra falar de esperança?

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Já regou os campos de onde nascem as mais lindas flores de primavera
alagou os charcos pantanosos de plantas malditas
encheu a poça em que a criança se banha no mar
escorreu nos navegáveis rios onde trabalha o pescador
quando o pé pisou virou lama
quando o peixe nadou virou caminho
mas não serviu pra matar a sede no deserto
água salgada
inundando o olhar
"A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”